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Notícia

Consumo resiste a juros altos

Vendas do comércio batem recorde no primeiro semestre e dados de julho e agosto indicam que as famílias se sentem confortáveis para gastar.

Autor: Gabriel CaprioliFonte: Correio Braziliense

Apesar do arrocho monetário promovido desde abril, o Banco Central ainda não conseguiu frear o consumo das famílias, que têm se consolidado como a principal alavanca da economia brasileira. As vendas do comércio continuam em expansão e registraram recorde histórico no primeiro semestre ao dar um salto de 11,5% na comparação com o mesmo período do ano passado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em junho, o varejo avançou 1% ante maio e 11,3% se comparado ao mesmo mês de 2009. O resultado confirma, segundo a instituição, que a queda pontual observada em abril foi superada e indicadores antecedentes do setor varejista apontam que os meses de julho e agosto seguiram a mesma trajetória. 

Todo este vigor deve impulsionar o crescimento do país, segundo avaliação de Reinaldo Pereira, economista do IBGE. “Em abril, achávamos que a queda do comércio era um movimento pontual, o que veio a se confirmar agora. Se a expectativa é de que o país cresça no mínimo 6% neste ano, as vendas do varejo vão acompanhar esse movimento”, afirmou. Também os analistas de mercado, surpreendidos pelo avanço em junho, avaliam os dados atuais da economia como indícios de que o desempenho do setor deve se estender para o segundo semestre. 

Segundo o economista Alexandre Andrade, da Consultoria Tendências, os dados do IBGE mostram que a demanda doméstica deve voltar a exibir uma trajetória de crescimento consistente nos próximos meses. “Não há por que esperar arrefecimento desse consumo”, disse. Para ele, o incremento da renda e da massa salarial deverão sustentar o aquecimento da demanda. 

Pelos cálculos do IBGE, o grupo hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo foi o principal responsável pelo crescimento do varejo, com avanço de 11,9% no semestre, sustentando metade da expansão do setor. “O resultado, acima da média, se justifica pelo aumento do poder de compra da população decorrente do crescimento da massa de rendimento real dos ocupados”, constatou Pereira. Com mais dinheiro no bolso, as classes de renda intermediária começam a comprar itens de maior valor agregado como iogurtes, produtos de beleza. De acordo com uma pesquisa do instituto Kantar World Panel, em 2002 as classes D e E tinham 21 categorias de produtos no carrinho do supermercado. Atualmente, são 37. 

Crediário 
A trajetória ascendente do comércio foi confirmada pelo indicador de consultas ao Serviço de Proteção ao Crédito (SPC-Brasil), também divulgado ontem pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL). As consultas guardam relação próxima com o volume de vendas, uma vez que são feitas no momento da aprovação do crédito ao consumidor. Entre junho e julho, os acessos cresceram 4,26% e avançaram 9,05% quando comparados a julho de 2009. O resultado surpreendeu os varejistas, segundo o presidente da CNDL, Roque Pellizzaro Junior. Ele esperava que o consumo fosse afetado pelo aumento de juros. “O freio que o BC tem colocado na economia (por meio do aumento de juros) não está parando a demanda. Está, no máximo, desacelerando” comentou. 

A despeito de não ter consolidado os dados de agosto, Pellizzaro acredita que as vendas devem continuar em alta, impulsionadas pelo Dia dos Pais. Em função da data, o comércio vendeu 11,73% mais do que em 2009. Para Alexandre Andrade, do IBGE, a força da renda é tanta que as compras não devem diminuir expressivamente nem mesmo quando o aperto monetário encarecer os financiamentos — efeito que deve ser observado nos próximos meses. “Tudo indica que, mesmo com o crédito se deteriorando um pouco, o consumo continuará forte em supermercados, por exemplo, em que os gastos são diretamente ligados ao maior poder de compra do trabalhador”, ponderou.

O freio que o BC tem colocado na economia não está parando a demanda. Está, no máximo, desacelerando” 
Roque Pellizzaro Junior, presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL)


Menos inadimplência no varejo


O aumento do volume de vendas, aliado à queda da inadimplência e ao aumento na preocupação dos consumidores em limpar o nome na praça, tem deixado os comerciantes otimistas em relação ao segundo semestre. De acordo com a Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), o número de pessoas que foram incluídas no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) entre junho e julho deste ano caiu 1,41%, enquanto a recuperação de crédito aumentou 17,9%. Quando considerado o primeiro semestre, o número de devedores recuou 2,53% e os registros retirados do SPC aumentaram 5,58%. 

Para o presidente da CNDL, Roque Pellizzaro Junior, o conjunto de dados reflete o bom momento da economia. “A manutenção do emprego e da renda está fazendo com que as pessoas saldem suas dívidas”, comentou. Apesar da redução da geração de empregos em junho, na comparação mensal, de quase 300 mil postos para 212 mil, divulgada pelo Ministério do Trabalho, os trabalhadores estão entrando no mercado de trabalho com salário médio inicial 27% maior do que no início do governo Lula, em 2003. Os dados são do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). 

De acordo com Pellizzaro, a explosão do número de consumidores que procuraram limpar o nome em julho foi influenciada pela entrada de recursos adicionais na economia, que complementaram o salário dos trabalhadores, como os primeiros lotes de restituição do Imposto de Renda e o adiantamento do 13º salário, concedido a algumas categorias. “Os números são bons, porque significam que o comércio está ficando mais capitalizado (com vendas maiores e sem inadimplência) e com melhores condições de oferecer bons financiamentos”, considerou. 

A CNDL prepara, para outubro, uma ação que pretende chamar os inadimplentes para quitarem suas dívidas. A campanha “Quero meu consumidor de volta” deve oferecer a negociação de débitos anteriores com redução de juros tanto para as contas atrasadas quanto para o refinanciamento.