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Recuperação empresarial: reflexões e correções

Em todo lugar, empresas podem entrar em dificuldades em decorrência de incapacidade financeira.

Em todo lugar, empresas podem entrar em dificuldades em decorrência de incapacidade financeira. Nos países desenvolvidos, mais de 80% têm sucesso na recuperação, enquanto no Brasil ocorre justamente o contrário: mais de 80% acabam em falência e encerramento de atividades. Como na vida não tem prêmio nem castigo, mas apenas consequência, é preciso entender as razões dessa trágica realidade local.

  1. Empresários acham que a solução para seu problema de incapacidade de pagar débitos está com seu advogado e no judiciário, razão pela qual, como ato corretivo, ligam para o advogado mais próximo e em quem confiam.

  1. A ampla maioria dessa estrutura jurídica, por desconhecimento técnico das causas das dificuldades ou por conveniência operativa, concorda com os empresários e assume o comando da tarefa de recuperação.

  1. Os credores, quer por falta de capacidade ou de vontade, em sua maioria e em quase todos os casos, preferem não encarar o problema e muito menos se envolver na busca da solução, com receio de serem eventualmente responsabilizados por alguma decisão ou ato que não produza os efeitos desejados e esperados.

  1. Esta “abstenção credora” é no Brasil agravada pelo arcabouço legal que aqui estabelece categorias de credores, alguns privilegiados, o que não torna todos iguais perante o problema, sua solução e, pior, a vontade de sua solução. Insere-se no clássico erro brasileiro de que “todos são iguais perante a lei, mas alguns são mais iguais do que outros”.

  1. Assim, todo o conjunto de atores não enxerga que deficiências financeiras, salvo raríssimas exceções, são consequência de decisões e ações de governança e de gestão e, portanto, por inquestionável lógica sistêmica, a sua solução reside em ajustes e mudanças de governança, gestão e operações.

  1. Aqui, é usual que os advogados e os próprios empresários ou executivos que os chamaram estruturem o que chamam de “plano de recuperação” que, na realidade, nada mais é do que um “pedido de desconto e prazo”.

  1. Ainda que os credores aprovem esse plano, é natural que em mais de 80% dos casos o final seja a morte empresarial, porque não se atacaram e resolveram as causas da má performance e incapacidade financeira, tanto porque não foram identificadas e mapeadas por quem sabe, quanto porque não se implementaram as ações corretivas necessárias.

Diante disso, é conceitualmente óbvio e tecnicamente claro que a solução para empresas em dificuldades financeiras e sua consequente recuperação passa, primeiro, pelo envolvimento de quem lida e conhece as dimensões de administração – finanças, pessoas, produção, venda, tecnologia, logística, estratégia, comunicação, controles – cabendo isso a uma equipe isenta, afinada, experiente e capacitada para desenhar um “plano de recuperação” que efetivamente viabilize a sobrevivência e a capacidade de pagar credores atuais e futuros. Para isto, evidentemente, o plano deverá conter todo o elenco de medidas corretivas gerenciais, inclusive de capitalização e origem de recursos, bem como o seu necessário ordenamento.

Em sequência, esse plano tornará transparente se a recuperação poderá ser feita de forma estritamente negociada e com acordos, de forma extrajudicial ou, eventualmente, judicial, cabendo a opção ser nesta ordem de preferência. Isto significa que, tecnicamente, o “plano de recuperação” deve ser elaborado, discutido e validado com os credores, antes da opção e decisão de qual caminho seguir.

Mesmo que as variáveis e o cenário recomendem o da recuperação judicial, no ato do pedido o “plano” já está elaborado, aceito e pronto para ser implementado. Esta é a essência do processo de reversão empresarial com estatística mais positiva no exterior.

No Brasil, a própria legislação pertinente induz a um erro mortal, ao estabelecer um prazo de meses para submeter um plano de recuperação a uma assembleia de credores, a partir da formalização do “pedido de recuperação”. Desconhecem os legisladores que diante deste “pedido” o já escasso crédito desaparece, a falta de dinheiro se multiplica e a probabilidade de morte empresarial se torna exponencial.

Assim, advogados e o judiciário são obviamente parte da solução, mas não são “A” solução, que passa, necessariamente, por estes novos caminhos.