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Ajuste de projeções, críticas e queda dos DIs: as consequências das falas de Campos Neto antes do Copom

Presidente do BC causa comoção ao afirmar que Selic será levada onde necessário, mas que não levará em conta "dados de alta frequência"

SÃO PAULO – O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, surpreendeu o mercado nesta terça-feira (14) ao afirmar que a taxa básica de juros, Selic, seria usada no combate à inflação, mas com ressalvas.

“Vamos levar a Selic aonde precisar, mas não vamos reagir sempre a dados de alta frequência”, disse o chairman. A declaração, última antes da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), causou divergência entre os analistas, uma queda nos juros futuros e uma revisão de expectativas para o ciclo de aperto monetário.

Segundo João Beck, economista e sócio da BRA, o mercado interpretou o que foi dito por Campos Neto como uma sinalização de que na reunião do Copom que ocorre nos dias 20 e 21 de setembro a taxa de juros será elevada na mesma magnitude que na anterior, ou seja, um ponto percentual.

“O ‘dado de alta frequência’ a que o presidente do BC se referiu foi o [Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo] IPCA de agosto, que veio bem acima do esperado. Assim, Campos Neto passa a mensagem de que não vai colocar tanto peso nesse indicador.”

Na onda de revisões, a Quantitas, por exemplo, reduziu de 1,25 ponto porcentual para 1 ponto porcentual a sua projeção de aumento da taxa Selic em setembro. “O BC obviamente não está com essa disposição de acelerar o ritmo, então voltamos para a projeção de 1 ponto”, explica o economista-chefe da Quantitas, Ivo Chermont, que havia elevado a projeção para 1,25 ponto após o IPCA de agosto. “Acho que o mais provável é manter esse ritmo de 1 ponto agora.”

Para Chermont, a estratégia do BC de manter o ritmo de alta em 1 ponto por reunião implica em um risco maior olhando para as expectativas de inflação, mas não necessariamente vai resultar em desancoragem.

“Acho que estava barato eles acelerarem, se mostrarem mais agressivos, uma vez que a curva já estava lá em 1,25 ponto. Mas é a estratégia do BC, e eles têm um cenário diferente do nosso de inflação e crescimento”, afirma.

A Quantitas agora espera quatro aumentos consecutivos de 1 ponto da Selic, até janeiro, seguidos por um últimos ajuste, de 0,75 ponto. Como resultado, a taxa básica de juros chegaria a 10,0% já no primeiro trimestre de 2022.

Já o economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani, além de revisar suas projeções, criticou a sinalização de Campos Neto. “Ficamos preocupados porque achamos que a decisão do BC foi antecipada em um evento fechado. Isso é grave e insere ruídos importantes na comunicação”, diz Padovani.

“Estamos reavaliando a projeção de alta de 1,25 ponto porcentual da Selic em setembro. Houve uma informação importante em um evento fechado, e aí dificulta muito a previsibilidade da próxima decisão do Copom.”

Na mesma linha, o sócio fundador da gestora Kapitalo, Carlos Leonhard Woelz, foi outro que criticou as declarações de Campos Neto. Para ele, a fala foi um “banho de água fria” e pode ser “um tiro no pé”.

Até agora, ressalta Woelz, o BC fez política monetária de tentar conter as expectativas inflacionárias dando respostas de curto prazo. “O BC errava no passado ao ser muito gradualista”, disse em evento da Eleven. O cenário para a inflação, afirmou Woelz, piorou muito nos últimos meses. “Está correndo o risco de perder um pouco o controle das expectativas e o mercado ir para cima deles.”

A maneira como o BC está fazendo a mudança de tom mostra que a instituição “quer errar para baixo”, elevando os juros de forma mais lenta. Se o BC alongar o horizonte de política monetária vai ser terrível, afirmou o gestor, pois não se sabe agora nem quem será o próximo presidente do Brasil. “O mercado pode interpretar isso como uma maneira de você fugir da responsabilidade de combater a inflação do ano que vem.”

“Foi um tiro no pé enorme”, disse Woelz, destacando que o BC está mostrando pouca disposição de colocar os juros de forma mais rápida no nível que a taxa básica deveria estar. “Parece que é um Banco Central que se for errar, vai errar para baixo, mas não para cima.”

O gestor disse que vai esperar a próxima reunião do Copom para ver se há mais informações da nova estratégia ou se não foi um erro de comunicação de Campos Neto, que está quebrando a estratégia feita até agora em direção a um maior gradualismo. “Não digeri ainda.”

A Ativa Investimentos, por sua vez, acredita em alta de 1,25 ponto porcentual da taxa Selic em setembro, mesmo com a sinalização do BC.

Para o economista-chefe da Ativa, Étore Sanchez, a declaração de Campos Neto visou conter os danos de precificações mais esticadas nos juros curtos. “Mas não podemos ser negligentes com o avanço das expectativas de inflação para 2022. Elas ficaram praticamente insensíveis à austeridade do BC. Não é só mais uma oscilação ou surpresa. São fatores conjuntos que ensejam por uma aceleração na restrição de política monetária”, afirma Sanchez, que projeta Selic a 8,50% no fim do ciclo.

Também a MB Associados espera um aumento de 1,25 ponto porcentual da taxa Selic em setembro, apesar da fala de Campos Neto. “Com uma inflação de 10% e com todos os riscos pela frente, sinalizar esse cenário é complicado. Não me parece que os modelos do BC vão indicar um quadro tranquilo para a inflação. O presidente fala isso agora, mas não necessariamente vai acontecer”, analisa o economista-chefe da MB, Sergio Vale.

Para o economista, a sinalização de uma alta de juros mais lenta pode dificultar o controle das expectativas para o IPCA de 2022, além de atrasar a reaceleração do crescimento. “O aumento de 1 ponto é possível, mas não deveria ser o caso. A avaliação conjuntural está virando unanimidade, com todo mundo revisando câmbio, inflação e Selic para cima. O BC dá um tom mais suave do que deveria”, diz Vale.

Mesmo antes das falas de Campos Neto, XP, Citi e Itaú haviam revisado projeções para o patamar da Selic no final do ciclo de aperto de juros.

O economista-chefe da XP, Caio Megale, destaca que a Selic deve ser elevada até 8,5% ao ano para combater o avanço mais disseminado da inflação registrado no último IPCA.

Já o Citi entende que o BC levará a taxa de juros até 8,75% no fim deste ano.

O Itaú, por fim, acredita em mais três aumentos consecutivos de um ponto percentual e um último de 0,75 p.p., levando a Selic a 9% ao ano em 2022.

(Com Agência Estado)