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Grande contribuinte está no foco da Receita
Nos próximos dias, 20 mil notificações de cobranças serão enviadas para empresas e pessoas físicas em dívida com a Receita
Adriana Fernandes e Renata Veríssimo
Depois de amargar uma queda no recolhimento de tributos por noves meses seguidos, a Receita Federal prepara uma ofensiva para recuperar a arrecadação e afastar os "efeitos predatórios" da crise financeira internacional no caixa do governo. O novo secretário da Receita, Otacílio Cartaxo, antecipou à Agência Estado que a estratégia é combater a inadimplência e intensificar a fiscalização de grandes contribuintes. Nos próximos dias, 20 mil notificações de cobranças serão enviadas para empresas e pessoas físicas em dívida com a Receita.
Efetivado no cargo há apenas oito dias, em meio a uma crise institucional do órgão, Cartaxo reafirma a orientação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, para reforçar a ação da Receita. Serão criadas duas novas delegacias, em São Paulo e no Rio de Janeiro, para fechar o cerco aos contribuintes de maior porte. O modelo será semelhante ao das delegacias especializadas em instituições financeiras, que também serão reforçadas com mais funcionários.
Ele assume a Receita após um processo difícil de escolha para substituir a ex-secretária Lina Vieira, que não escondeu o desconforto com a demissão e estimulou o levante dos superintendentes regionais, atitude que desagradou ao governo. Cartaxo fala em reforçar o perfil técnico e admite a necessidade de "mudanças pontuais" na equipe.
A seguir, os principais trechos da entrevista, concedida na quinta-feira, à noite.
Qual é sua estratégia de gestão para colocar a Casa em ordem e pacificar a crise institucional gerada pela saída da secretária Lina?
Uma das principais metas de todo o gestor público é manter a Casa em harmonia, operando com eficiência. Isso me foi especialmente recomendado pelo ministro Mantega. O nosso lema é: trabalhar, fiscalizar e arrecadar.
Os superintendentes não ficaram satisfeitos. Querem a garantia de que terão autonomia para tocar o projeto de mudança iniciado por Lina.
Essa garantia não só os superintendentes terão. Toda a Casa terá. Esses projetos são institucionais, aprovados pelo ministro, e pertencem à Receita e não ao secretário. São prioritários.
O sr. é um elemento de consenso na categoria?
Esse é objetivo de todo o gestor público, inclusive o meu. Recebo manifestações de apoio dos administradores da Receita regionais e locais, colegas e entidades representativas de classe.
Qual será a sua linha de atuação administrativa?
É a de harmonia institucional e do trabalho em equipe. Disputas internas não contribuem para o bom desempenho. A Receita tem de estar focada na sua atividade: assegurar a arrecadação, de forma a garantir o funcionamento do Estado.
O sr. pretende fazer uma renovação no quadro de superintendentes?
Não pretendo fazer uma nova renovação nos termos da sua pergunta. Eles estão fazendo um bom trabalho. A administração se desenvolve em um processo contínuo, no qual as mudanças podem ocorrer quando necessárias. Mudanças eventuais estão dentro da normalidade. É uma rotina da administração, principalmente levando-se em conta o tamanho da casa.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficou insatisfeito com o desempenho da Receita na crise. Qual a estratégia para a recuperação da arrecadação?
A recuperação da arrecadação depende dos desdobramentos da crise e dos efeitos das medidas de desonerações, que resultaram na perda de alguns bilhões, mas preservaram a massa salarial, o emprego e a renda.Diversas medidas estão sendo preparadas para fazer frente aos efeitos predatórios da crise na arrecadação.
Quais?
Intensificar a cobrança de débitos em aberto para combater a inadimplência. Serão expedidas mais de 20 mil notificações. Vamos incentivar a regularização de pendências, como o parcelamento decorrente da crise que já está em execução. Só nos primeiros dias já houve uma adesão de mais de 27 mil contribuintes. Com a vitória da Fazenda no Supremo Tribunal Federal (STF), também vamos cobrar o IPI-Prêmio.
A Receita mantém a linha da ex-secretária de focar nos grandes contribuintes?
O foco continuará como ação prioritária. Nessa linha, estamos com programas de treinamento para ampliar os grupos de auditores especializados na fiscalização dos grandes contribuintes nos diversos setores da economia. Isso será feito de forma associada e complementar com outras estratégias para assegurar o cumprimento das obrigações tributárias. Estamos estudando a criação, no Rio e São Paulo, de delegacias especializadas na fiscalização dos grandes contribuintes.
Com essa estratégia se abandona o controle dos médios e pequenos contribuintes?
Não, são estratégias complementares. O foco nas grandes empresas é tendência mundial e se justifica pelo seu elevado porcentual na arrecadação.
A sonegação aumentou em função deste ambiente de mudança na Receita?
Apesar da crise econômica, a arrecadação voluntária permanece no patamar de 95%. É uma performance difícil de ser alcançada. É um índice de eficiência.
As contribuições previdenciárias seriam as mais sonegadas?
É uma desinformação total. O crescimento real da contribuição previdenciária é de 5,8% (janeiro a julho). É o único tributo que, mesmo durante a crise, continuou crescendo de forma sustentada, por conta das medidas anticíclicas, implementadas pelo ministro (da Fazenda) Guido Mantega. Preservaram o emprego e a renda. De janeiro a junho deste ano, foram fiscalizadas 3.239 empresas, com lançamentos de R$ 4 bilhões de crédito tributário (só previdenciário). Houve um crescimento real superior a 130% em relação ao mesmo período de 2008, quando foram fiscalizadas 3.240 empresas e lançados R$ 1,7 bilhão.
Quando os sinais de recuperação econômica serão percebidos na arrecadação?
Até dezembro. Não sei em que mês porque depende da economia internacional. Nós trabalhamos com um cenário de recuperação a partir do último trimestre.
Qual é a prioridade da Receita?
Superar a situação atual de crise econômica e retomar os patamares previstos de arrecadação. Há indicadores que apontam para a retomada da economia.
Foi um equívoco permitir o ajuste da contabilidade para pagar menos tributo, como fez a Petrobrás?
O regime de caixa apenas posterga o pagamento do imposto para a data de liquidação das obrigações e aplica-se o câmbio do dia. Portanto, pode haver variações cambiais para cima e para baixo, refletindo na base de cálculo do imposto e no valor a ser recolhido. De acordo com o regime de caixa, a obrigatoriedade do recolhimento só se torna exigível a partir do ingresso efetivo dos recursos no caixa da empresa. Ao contrário do regime de competência, que independe da realização financeira das operações.