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Recuperação judicial depende de registro na Junta

A decisão é da Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais, para quem o produtor tem acesso às benesses do regime aplicado ao empresário comum só a partir do momento em que opta pelo registro da empresa.

Autor: Fernando PorfírioFonte: Consultor Jurídico

Se não tiver seu empreendimento registrado na Junta Comercial, o fazendeiro, mesmo inscrito na Receita Federal, não pode ser tratado como empresário e usufruir do regime previsto na nova Lei de Falências e Recuperação Judicial. Com esse argumento, o Tribunal de Justiça de São Paulo negou a um grupo de produtores rurais o benefício da Lei 11.101/05, devido à falta de inscrição na Junta estadual. A decisão é da Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais, para quem o produtor tem acesso às benesses do regime aplicado ao empresário comum só a partir do momento em que opta pelo registro da empresa.

O recurso foi capitaneado por uma produtora rural de Palmital (SP). O pedido se baseou no artigo 971 do Código Civil, e argumentou que, com a nova lei, o agricultor e o pecuarista deixaram de ter apenas o pequeno aspecto civil e familiar para se transformarem em empresários. A defesa dos ruralistas ainda alegou que aquele que há anos atua na atividade rural e está devidamente inscrito como pessoa jurídica tem os direitos previstos na nova Lei de Falências.

A produtora rural juntou ao processo sentença do juiz Marcos José Martins de Siqueira, da Comarca de Várzea Grande,  em Mato Grosso, que concedeu a recuperação judicial à Alcopan – Álcool do Pantanal Ltda. Em janeiro do ano passado, o juiz deu prazo de 70 dias para que os produtores rurais responsáveis pela empresa apresentassem um plano de recuperação. No entanto, o juiz afirmou na decisão que a Alcopan mantinha registro na Junta Comercial de Mato Grosso.

No caso do recurso da produtora paulista, a câmara reservada do Tribunal de São Paulo reconheceu que o Código Civil de 2002 inovou ao regulamentar a figura do empresário rural. O entendimento da turma julgadora é o de que não basta que o produtor rural tenha inscrição na Receita Federal (CNPJ) para ser equiparado a empresário para ter direito à recuperação judicial.

De acordo com os desembargadores, o artigo 971 do Código Civil faculta ao produtor rural inscrever-se no Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais. O mesmo Código estabelece que aquele que exerce atividade econômica é empresário e está obrigado a fazer sua inscrição no mesmo órgão registrador.

Para a turma, a situação do produtor rural é diferente. Ele não está obrigado ao registro, que é facultativo. Mas, para que seja equiparado ao empresário de fato, é preciso que faça a opção pela inscrição, quando passa a ser empresário e a se submeter ao regime jurídico próprio. A inscrição modifica seu statuspessoal, submetendo-o a novas regras definidoras de obrigações e direitos, entendeu o tribunal.

Ou seja, para ter acesso ao instituto da recuperação judicial, não basta o exercício da “atividade rural há muitos anos”, nem a inscrição em cadastros federais e estaduais. É imprescindível que, para equiparação com o empresário, com direito à aplicação da Lei 11.101/05, é preciso estar registrado na Junta Comercial.

No entendimento do relator do recurso, desembargador Romeu Ricupero, o novo código Civil agiu acertadamente ao instituir, na área rural, a faculdade de se fazer o registro e se adotar o regime empresarial. Em sua opinião, existe uma gama muito heterogênea de atividades no setor agrícola, sendo difícil estipular a regra da obrigatoriedade sem prejudicar os objetivos constitucionais referentes à propriedade rural. “Em suma, o produtor rural que valer-se da faculdade legal e se inscrever na Junta Comercial, por força da equiparação legal, ficará sujeito aos mesmos deveres do empresário mercantil e, obviamente, terá os mesmos direitos”, afirmou.

Esta não é a primeira vez que o tema é decidido dessa forma na Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais. Em setembro do ano passado, o desembargador Pereira Calças, julgando pedido da Cooperativa Agrícola Mista de Adamantina, mostrou o mesmo entendimento.

Segundo Pereira Calças, o novo Código Civil (Código Reale), da mesma forma que o antigo, continua a considerar o produtor rural como empresário que não está sujeito ao registro obrigatório na Junta Comercial (arts. 966 e 967). No entanto, segundo o desembargador, o artigo 971 estabelece que o empresário cuja atividade rural seja sua principal profissão poderá inscrever-se no Registro Público de Empresas Mercantis. Nesse caso, depois de inscrito, estará equiparado ao empresário sujeito ao registro.

Para Pereira Calças, o legislador admitiu a existência de dois tipos diferentes de empresários: o mercantil, sujeito ao registro obrigatório (artigos 966 e 967), e o rural (artigo 971) que tem a faculdade de inscrever-se na Junta Comercial. “O produtor rural que valer-se da faculdade legal e se inscrever na Junta Comercial, por força da equiparação legal, ficará sujeito aos mesmos deveres do empresário mercantil e, obviamente, terá os mesmos direitos”, decidiu o desembargador.

Acompanhando a linha de argumentação de Pereira Calças, uma vez inscrito na Junta Comercial, o produtor rural deverá escriturar contabilmente os livros empresariais obrigatórios e elaborar anualmente o balanço patrimonial e de resultado econômico (artigo 1.179 do Código Civil). Além disso, ficará equiparado à pessoa jurídica para fins de apuração do Imposto de Renda (artigo 160, I, do Decreto n° 3.000/99), estará sujeito a falência, se caracterizadas as hipóteses do art. 94 da Lei 11.101/2005, e terá direito a recuperação judicial, desde que atendidos os requisitos do artigo 48 da Lei 11.101/2005.

Apelação 994.09.293031-7